Coluna do Sport | Perdoável, questionável e inadmissível
Dançar na Ilha do Retiro nunca foi crime nem desrespeito
Vamos tratar a coluna desta semana em três pontos.
No primeiro, o destaque vai para uma situação “perdoável”:
As falhas da dupla Marcão e Marquinhos no jogo contra o Náutico demarcam bem os altos e baixos do futebol. Apesar de ter sido uma partida de final, a mesma dupla foi protagonista em outro jogo tenso em fevereiro passado. A recordação é da vitória contra o Internacional, em Porto Alegre, no momento em que praticamente o Leão carimbou a permanência na Série A. Ou seja, jogo também importante como um título estadual. E, para não perder a piada… parece que a dupla trocou as bolas entre o Beira-Rio e os Aflitos.
Na segunda parte, puxamos um assunto “questionável”:
O que levou Umberto Louzer a escalar Thiago Neves como falso nove e deixar Mikael no banco na final? O treinador falou que o prata da casa não estava 100% fisicamente. Daí vem a pergunta: e Thiago Neves estava? Foi estratégico mexer na formação do time justo na final? É verdade que o Náutico estava com um time mais ajustado e entrosado pelo conjunto da temporada, mas o Sport tem um elenco teoricamente mais forte. No mínimo teríamos um equilíbrio. Será que Louzer respeitou demais o adversário e desrespeitou demais o prata da casa? Os últimos minutos da partida deixaram um gostinho de que impondo pressão, a história poderia ser diferente.
A terceira parte desta coluna vai ainda para o caso Gil do Vigor.
Não foi possível escrever antes por uma questão de sequência dos fatos. Em outras palavras, os fatos repercutiram exatamente após a elaboração de uma coluna. Mas, antes tarde que nunca.
Nunca gostei do BBB. Isso não me faz “achar” ou “não achar” nada demais sobre quem gosta ou quem não gosta do reality show mais antigo no país. Assim como o próprio futebol (que amo), o BBB é essencialmente entretenimento. Ou seja, também não gosto que “achem” ou “não achem” algo de mim porque vou a estádios de futebol, acompanho resenhas esportivas no rádio e vibro (ou sofro) com o meu time.
Dito isso, falamos sobre preferências, que devem ser respeitadas. Gostar ou não gostar de algo é direito de todas as pessoas.
Outra dimensão – bem mais ampla que gostar ou não gostar – é a nossa responsabilidade na construção de uma sociedade justa, plural, diversa e fraterna. Ou seja, uma sociedade que reconhece as outras pessoas primeiramente pela sua condição humana, e não por “gostar”, “não gostar”, “tolerar” ou até “matar”.
As declarações que repercutiram nos áudios vazados pelo conselheiro do Sport ressaltaram a face de quem “não gosta” de ver a expressão de outras pessoas ao julgar sua sexualidade. Como se a Ilha do Retiro tivesse algumas pessoas torcedoras “mais donas” que outras, em que só poderiam dançar quem se “gosta” ou quem se “tolera”.
Ao exercitar um pensamento pragmático (capaz de apagar qualquer indício de homofobia), o que restaria para acusar o gesto de Gilberto Nogueira, o Gil do Vigor, como algo tão grave e sério que merece tanto ódio?
Qual a diferença, por exemplo, entre Gil do Vigor expressar uma dança na Ilha do Retiro e tantos jogadores que desde décadas atrás apresentaram seus passos pelos estádios do Brasil e do mundo?
Mais que falar em “gostar” ou “não gostar” de uma simples dança, a repercussão negativa diante dos áudios vazados seguem o fluxo de preocupação de quem não aceita tantas vidas que são perdidas ano a ano no país única e exclusivamente por conta da homofobia.
O nível de xingamentos faz parte do contexto de mortes de pessoas LGBTQI+. Além de ofender diretamente, alimenta todo o imaginário que resulta em dados como as 237 vidas perdidas no ano passado, apenas por conta da sexualidade da vítima. Esse dado foi apresentado pelo Observatório de Mortes Violentas de LGBTI+.
Dançar na Ilha do Retiro nunca foi crime nem desrespeito. O Sport é todos e todas, em suas expressões, identidades e sentimentos.
Edição: Vanessa Gonzaga
Fonte: https://www.brasildefatope.com.br/2021/05/29/coluna-do-sport-perdoavel-questionavel-e-inadmissivel