Escola que fez postagem homofóbica contra publicidade de lanchonete é denunciada ao Ministério Público
Por Inácio França
Quando o Ministério Público e a secretaria estadual de Educação reabrirem as portas nesta segunda-feira, dia 28 de junho, e iniciarem o expediente, seus funcionários irão se deparar com, pelo menos, 11 denúncias registradas nas respectivas ouvidorias contra a escola Ecco Prime. No final de semana, a escola, sediada em Aldeia, publicou uma série de postagens homofóbicas pregando um clima de “guerra santa” contra a rede de lanchonetes Burger King, que levou ao ar uma campanha publicitária em que crianças afirmam, com naturalidade, não haver nada demais em conviver com homossexuais.
As postagens da escola incitam os pais a defenderem as crianças do “ataque” dos homossexuais: “Famílias cristãs, estejam atentas! Nossas crianças estão sendo atacadas (…) este é apenas um dos muitos ataques que enfrentam todos os dias sem antes estarem preparados”. Em seguida ao alerta, recorre a uma linguagem bélica para anunciar a criação de um tal Centro de Treinamento de Pais Cristãos “com o intuito de nos armamos contra estas e outras setas inflamadas do inimigo”.
As reações foram imediatas. Ainda no sábado pela manhã, o professor de Biologia da Universidade de Pernambuco e morador de Aldeia, Filipe Aléssio, foi um dos primeiros a pedir que seus seguidores nas redes sociais denunciassem a publicação ao Instagram. No domingo à tarde, as postagens ainda estavam disponíveis no feed do perfil da escola, indicando que o Facebook, empresa que controla o Instagram, não considerou as denúncias.
A publicação homofóbicas e outras postagens já tinham recebido mais de 3.300 comentários, quando a média das demais publicações da escola não passa de poucas dezenas. Pelo menos 11 das pessoas que confrontaram a Ecco Prime nas redes sociais confirmaram a formalização das denúncias no MPPE e na secretaria de Educação.
Uma delas foi a jornalista Sylvia Siqueira Campos. No final da tarde de domingo, ela, que é vizinha da escola, estava finalizando uma denúncia formal que será assinada por um coletivo de pessoas físicas e jurídicas. “Não queremos moralizar a denúncia, porque este caminho é frágil. É preciso reivindicar os dispositivos legais nos quais se baseiam a educação de um estado laico, por isso estamos encontrando as bases na Lei Estadual de Educação e na jurisprudência do STF, além dos argumentos sobre a incitação à violência”, afirma Sylvia.
Para a ativista, que integra a rede internacional pela educação articulada pela paquistanesa Malala Yousafzai, prêmio Nobel da Paz. “o que a escola fez está muito distante de ‘liberdade de opinião’. A liberdade de opinião existe quando não fere o direito de existência e de segurança da vida da outra pessoa”.
Bolsonarismo e propaganda
Ao longo do domingo, foi a vez de parlamentares evangélicos, pastores fundamentalistas e perfis autodeclarados fascistas partirem para o contra-ataque, elogiando a iniciativa, atacando os hambúrgueres “comunistas” da franquia de lanchonetes e entupindo a seção de comentários do perfil do site de notícias Aldeia da Gente, que publicou nota de repúdio contra a Ecco Prime.
Alguns bolsonaristas, como a deputada estadual Ana Caroline Campagnolo, do PSL de Santa Catarina, também aproveitaram para romper o silêncio em que estavam desde sexta-feira, quando foi revelado na sessão da CPI da Covid que Bolsonaro estaria a par do esquema de superfaturamento da vacina Covaxin.
Respaldada pelo apoio da extrema-direita, a escola também reafirmou seu posicionamento usando os versículos 26 a 32 do capítulo 1 da Carta aos Romanos como argumento: “A Bíblia diz que a homossexualidade é pecado, é não natural e não normal”, concluindo com um pedido de orações pela escola. A nota da escola não faz referência, contudo, aos versículos 23 e 24 do capítulo 7 da mesma carta de São Paulo aos Romanos nem ao segundo livro de Samuel, trechos frequentemente usados como argumento de que não há pecado algum na homoafetividade.
Nas postagens originais, a Ecco Prime International Christian School (sim, esse é “nome completo” da escola), aproveitou para fazer propaganda de suas estratégias contra as tais “setas inflamadas” do inimigo. Para vencer a ameaça representada pelos sanduíches da norte-americana Burger King, a Ecco Prime anunciou que também conta com aliados vindos dos Estados Unidos: direto de Ohio, um pastor chamado Tedd Tripp foi convidado para ir até Aldeia explicar presencialmente como os pais cristãos podem evitar que seus filhos e filhas se tornem gays, lésbicas ou trans por apenas R$ 267,00 ou em 12 vezes de R$ 26,00 no cartão de crédito.
Matéria originalmente publicada em: https://marcozero.org/escola-que-fez-postagem-homofobica-contra-publicidade-de-lanchonete-e-denunciada-ao-ministerio-publico/